compositor carioca Lamartine Babo certa vez recebeu uma carta apaixonada de Nair Pimenta de Oliveira, moradora de Boa Esperança, no sul de Minas. A moça dizia-se grande fã de suas músicas e, com isso, passaram a se corresponder por cartas. Passado algum tempo, Lamartine recebeu o convite de um dentista para conhecer Boa Esperança. Chegando lá descobriu que Nair era, na verdade, o tal dentista chamado Carlos Alves Neto. Sem perder o bom humor, Lamartine compôs uma de suas mais belas canções, Serra da Boa Esperança.
Muitos anos depois, a música que descreve a dor do poeta ao deixar sua terra "no coração do Brasil" inspirou os empresários Gil e Silvia Moura no batismo de sua cachaça, pois eles procuravam uma marca que simbolizasse as belezas de Boa Esperança. "A canção de Lamartine Babo fala um pouco da nossa própria história, já que fomos criados na capital, mas sentimos saudades da cidade onde nasceu toda a família. Queríamos de algum modo homenagear Boa Esperança, a cidade dos cafezais e do Festival da Canção, que já tem mais de 40 anos de história", explicam Gil e Silvia Moura, proprietários do Alambique Toledo e Moura Ltda.
O batismo então se deu e a cachaça foi registrada como "Serra da Boa Esperança". Porém, seu nome foi reduzido (pelo fato de o adjetivo "Da Boa" fazer parte do próprio nome) e passou a ser conhecido em Minas como Da Boa, uma estratégia dos produtores, que tiveram a ideia de um rótulo que destacasse a expressão, clara referência ao universo da cachaça. "Conseguimos explorar um nome que está na cabeça de todo brasileiro quando vai tomar uma pinga: esta é da boa!", brinca Gil.
A serra da Boa Esperança é um acidente geográfico no meio rural de Boa Esperança e municípios adjacentes. Possui aproximadamente 100 km², que vai desde a Serra Azul, passando pela Serra do Buracão, até o Chapadão. Ali, num de seus enclaves, o casal Gil e Silvia fundou em 2003 o Alambique Toledo e Moura Ltda., localizado na Fazenda Várzea do Ribeirão de São Pedro, numa região cercada de plantações de café, milho e criação de gado leiteiro.
A ideia dos empresários era produzir uma cachaça artesanal de qualidade, que se tornasse referência na região de Boa Esperança. "A nossa família é do sul de Minas, mas moramos em Belo Horizonte há muitos anos. Queríamos investir na nossa terra, e a cachaça apareceu como oportunidade. No começo o objetivo era o lucro, depois passamos a nos encantar com a produção do alambique", explica Gil.
Na época, o engenho foi todo montado dentro dos padrões do Ministério da Agricultura, com o objetivo de colocar a cachaça Da Boa, como ficou popularmente conhecida na região, no mapa das cachaças artesanais de qualidade.
Merecem destaque os dois alambiques capelos, a estrutura produtiva em elevação – moenda e fermentação na parte mais alta, e a caldeira na parte mais baixa –, fora as duas grandes adegas com mil barris de carvalho escocês no total e nove tonéis de 5 mil litros de jequitibá-rosa. Há ainda dois tonéis de jequitibá de grande volume – um de 50 mil e outro de 70 mil litros.
A qualidade técnica e a infraestrutura da fazenda Várzea do Ribeirão de São Pedro impressionam. Gil Moura conta que no início pediu apoio à Universidade Federal de Lavras (UFLA), que prestou consultoria e forneceu leveduras selecionadas para o processo de fermentação. O resultado é uma bebida de qualidade com leve toque frutado e suavidade característica.
Além de produzir 120 mil litros por ano de cachaça, o Alambique Toledo e Moura mantém um rigoroso padrão técnico voltado à preservação ambiental. A água usada no resfriamento do alambique é reutilizada junto com o vinhoto na irrigação; o bagaço vai para a caldeira e também serve de alimento para o gado. O engenho possui ainda uma nascente, uma represa de 10 mil metros quadrados e uma reserva ambiental de 3,5 hectares.
E quando o assunto é religiosidade, a Da Boa também tem sua fé. Gil conta que sua mãe Luzia Augusta trouxe de Portugal uma pequena imagem de Nossa Senhora de Fátima. A família devota construiu uma pequena capela na entrada da propriedade. Toda essa estrutura da Fazenda Várzea do Ribeirão de São Pedro fez tanto sucesso que entrou para o roteiro turístico do município de Boa Esperança.
Atualmente, a cachaça Da Boa é comercializada no sul e oeste de Minas, Zona da Mata e Região Metropolitana de Belo Horizonte, além dos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e capitais do Nordeste. Gil Moura conta que parte expressiva das vendas é feita por meio de distribuidores, fora as vendas diretas.
Com produção anual de 120 mil litros, o Alambique Toledo e Moura Ltda. tem conseguido comercializar 30% de sua produção, sendo o restante envelhecido com o objetivo de lançar lotes especiais com valor agregado. Além da qualidade técnica da cachaça Da Boa, já certificada pelo Inmetro, mediante o Programa Nacional de Certificação da Cachaça em 2007, e pelo selo da AMPAQ em 2004, que faz parte do primeiro critério para comercialização. Gil e Silvia acreditam que o momento agora é investir em estratégias de marketing e formar parcerias com distribuidores e representantes de outros estados a fim de levar a marca de Boa Esperança para todo o Brasil.